A comunidade cristã primitiva era uma igreja vibrante e sempre serviu de modelo e inspiração para as gerações de crentes que estavam no futuro. Apesar deste vigor espiritual, ela tinha um problema: não era uma igreja missionária. Nos primeiros anos de sua existência ela resistiu a ordem de Cristo de pregar o evangelho a toda a criatura (Mt 28.19). Deus teve que permitir que sobreviesse a perseguição sobre a igreja para que ela se espalhasse e por fim começasse a pregar as boas novas para outros povos. O evangelista Lucas explica que “naquela ocasião [a morte de Estevão] desencadeou-se grande perseguição contra a igreja em Jerusalém. Todos, exceto os apóstolos, foram dispersos pelas regiões da Judéia e de Samaria.” (At 8.1). Como resultado desta perseguição o evangelho chegou até a Antioquia: “Os que tinham sido dispersos por causa da perseguição desencadeada com a morte de Estevão chegaram até a Fenícia, Chipre e Antioquia.” (At 11.19). Nesta cidade se formou uma igreja que influenciou ao mundo até os nossos dias.
Antioquia perdia em importância no Império Romano apenas para a capital, Roma, e Alexandria, no Egito. Acreditasse que na época apostólica ela tinha cerca de meio milhão de habitantes. No primeiro momento, o evangelho foi pregado apenas aos judeus que viviam nesta cidade, mas vários convertidos da ilha de Chipre e da cidade de Cirene, que ficava no norte da África, migraram para lá também e começaram um trabalho em favor dos gregos. O resultado desta quebra de paradigma teve como resultado o crescimento daquela igreja: “A mão do Senhor estava com eles, e muitos creram e se converteram ao Senhor”, At 11.21.
O impacto desta igreja sobre aquela cidade chamou a atenção da igreja de Jerusalém. Barnabé foi enviado até a cidade de Antioquia para avaliar a situação. Quando ele chegou lá ficou tão empolgado que se envolveu no trabalho que aquela comunidade estava realizando. Lucas comenta que o ministério de Barnabé foi tão frutífero entre aqueles crentes que o resultado foi que a igreja continuou crescendo: “muitas pessoas foram acrescentadas ao Senhor.” (vers. 24).
Qual é o segredo da vitalidade desta igreja? Será que podemos aprender alguma coisa com o povo de Deus que vivia na Antioquia que possa ser aplicada em nossas comunidades atuais? Movido por estas questões o pesquisador Christian Schwarz, que dirige o Instituto para o Desenvolvimento da Igreja na Alemanha, desenvolveu uma pesquisa durante dez anos em mais de mil igrejas em 32 países nos cinco continentes para descobrir os princípios espirituais que fazem as igrejas crescerem.[1] Esta pesquisa é o estudo mais abrangente já realizado sobre as razões do crescimento de uma igreja local. Como resultado deste estudo ele conseguiu identificar oito características universais que toda igreja que cresce possui. Ele denominou a sua proposta resultante de desenvolvimento natural da igreja por que ele acredita que se uma igreja local quiser crescer deve ser um processo natural, tal como acontece na natureza. O mais impressionante é que estes mesmos princípios identificados por este pesquisador nas igrejas prósperas de hoje podem ser reconhecidos na comunidade cristã de Antioquia dos tempos apostólicos. Como não poderia ser diferente, estes mesmos princípios destacados pelo estudo de Schwarz são apoiados por Ellen G. White. Se você quiser que sua igreja cresça deve seguir estes mesmos princípios e quais são eles?
1. LIDERANÇA CAPACITADORA.
O estudo de Christian Schwarz identificou uma característica comum entre as igrejas que estão crescendo: sua liderança é capacitadora. Isso quer dizer que a liderança da igreja está preocupada em formar novos líderes. Na igreja da Antioquia havia esta preocupação também. Quando Barnabé chegou naquela comunidade percebeu que o trabalho que tinha pela frente era maior do que ele podia atender. Por isso foi buscar o jovem pregador de Tarso, que se tornou conhecido pelo nome de Paulo (cap. 11.25), para ajudá-lo no se ministério. Um detalhe que chama a atenção deste chamado é que ninguém acreditava no potencial daquele jovem. Depois de sua conversão no caminho de Damasco a própria liderança da igreja em Jerusalém pediu que ele voltasse para a sua terra natal. Eles não viam o que Deus planejava para a vida daquele jovem missionário. Como ele era impetuoso e provocava reações diversas entre os membros da igreja, eles preferiram enterrar os seus talentos em um canto do império Romano onde ele poderia viver sem provocar problemas. Barnabé era um home de visão diferente. Ele via além das circunstâncias e aparências. Ele viu o que aquele jovem bem dirigido poderia fazer pelo reino de Deus. O resultado da fé deste homem de Deus você já sabe.
Em questões de liderança existem vários modelos que se adaptam ao temperamento do líder. Algumas pessoas exercem uma liderança mais democrática, onde todas as pessoas debaixo de sua responsabilidade são ouvidas e estimuladas a darem a sua contribuição. Há líderes mais autocráticos, que estabelecem metas e estratégias e espera que seus liderados sigam a suas diretrizes sem muito questionamento. Outros preferem distribuir responsabilidades e apenas supervisiona como cada liderando está se saindo. O pecado que um líder não pode cometer é o da imissão. Na liderança cristã não importa muito o estilo de sua liderança. O que conta é que ela seja capacitadora. Ou seja, o líder cristão deve ensinar os seus liderados a fazerem o trabalho, da mesma forma como Jesus treinou os seus discípulos por preceito e exemplo. O líder de uma igreja que cresce está preocupado em desenvolver as potencialidades dos seus membros e em lhes dar suporte e treinamento. Este é o perfil bíblico ideal de um líder cristão. O apóstolo Paulo deixa claro que as pessoas que recebem os dons liderança da igreja (profeta, apóstolo, evangelista, pastor-mestre) devem “preparar os santos para a obra do ministério” (Ef 4.12). Quem deve fazer a obra de Deus são os membros e não os seus líderes. É sua atribuição equipar, habilitar, treinar os membros para se realizarem a missão de pregar o evangelho ao mundo. Esta opinião é compartilhada por Ellen G. White:
“A melhor ajuda que os pastores podem prestar aos membros de nossas igrejas não consiste em pregar-lhes sermões, mas em planejar trabalho para que o façam. Dai a cada um algo para fazer em prol de outros.” 3TS 323.
Um erro comum cometido por alguns pastores ou obreiros é tentarem fazer todo o trabalho que deve ser feito pelos membros. Além de não conseguir fazer isso, ele pode ficar à beira de um colapso nervoso. Contra esse método contrario ao plano de Deus, Ellen White advertiu: “Algumas vezes os pastores trabalham em excesso; procuram tomar todo o trabalho em suas mãos. Isto os esgota e prejudica; contudo continuam a se envolver com tudo. Parece que pensam que só eles devem trabalhar na causa de Deus, ao passo que os membros da igreja ficam ociosos. Esta não é, de maneira alguma, a ordem de Deus.” Ev 113.
Se um líder cristão seguir esta estratégia estará preparando a próxima geração de líderes que vão levar a obra de Deus à diante. Quando não se segue este plano, as idéias e projetos, por mais inovadores e bem sucedidos que possam ser, são abandonados quando por qualquer motivo o seu idealizador é mudado de posição. Por isso, às vezes muitos bons planos em diversos departamentos na igreja são abandonados. Não há uma nova liderança preparada para continuar a sua execução. Não há continuidade no trabalho.
2. OS MEMBROS DA IGREJA CONHECEM E USAM OS DONS ESPIRITUAIS.
Em Atos 13.1 é dito que na igreja de Antioquia havia mestres e profetas. Ela era uma igreja onde os dons espirituais eram conhecidos e usados. Segundo o plano de Deus para a igreja, cada membro tem seu lugar no corpo de Cristo. Ao receber a Cristo como seu Salvador, o crente recebe do Espírito Santo determinadas habilidades espirituais para desempenhar o seu papel na Obra de Deus. A esta capacitação chamamos de “dons espirituais”. É como se costuma dizer: “Deus não chama os habilitados, mas habilita os chamados.”
Todo crente recebe um conjunto de dons espirituais. Segundo Paulo a divindade está diretamente envolvida nesta questão. Ele ensina que quem dá o dom é o Espírito Santo (1Co 12.11), quem define o campo de atuação, ou o ministério, é Cristo e quem dá o resultado do trabalho é Deus Pai (1Co 12.4-6).
“Deus confere Seus dons conforme Lhe apraz. Concede um dom a um, e outro dom a outro, mas tudo para o bem do corpo todo. Está no plano de Deus que alguns sirvam em um ramo de trabalho, e outros em ramos diversos – trabalhando todos sob o mesmo espírito. O reconhecimento deste plano será uma salvaguarda contra a emulação, o orgulho, a inveja, ou contra o desdém de um ao outro. Fortalecerá a unidade e o amor mútuo.” CPPE 314, 315.
Quando cada membro do Corpo de Cristo descobre o dom espiritual que recebeu de Deus e o usa no setor definido por Ele a igreja passa a trabalhar segundo a direção divina. Os resultados não vão demorar a aparecer.
Quantas vezes a igreja não reconhece este plano divino e acaba colocando nos seus departamentos a pessoa certa no lugar errado. Imagine o sofrimento de uma irmã que assume o departamento infantil da igreja local, por que não tem ninguém que a queira tomar a frente. Isso será um fardo para ela, para as crianças e para a igreja. Às vezes esta situação perdura por anos a fio com prejuízo para todos. Devemos reconhecer que Deus capacitou uma pessoa para cada necessidade da igreja local, mesmo que a pessoa não seja quem desejamos.
Para que isso aconteça é necessário que os membros da igreja conheçam os dons espirituais existentes e aprendam a colocá-los bem prática. Segundo levantamento feito por Christian Schwarz com 1600 cristãos ativos em igrejas alemãs descobriu-se que 80% deles não sabem quais são os seus dons espirituais. Em nossa igreja essa porcentagem deve ser maior, por que este tema não tem sido estudado com regularidade.
3. ESPIRITUALIDADE CONTAGIANTE.
A igreja de Antioquia era tão entusiasmada em sua fé por Cristo que foi lá que “os discípulos foram pela primeira vez chamados cristãos.” (At 11.26). Ellen White comenta:
“Este nome foi-lhes dado porque Cristo era o principal tema de sua pregação, conversação e ensino. Continuamente estavam eles repetindo os incidentes ocorridos durante os dias de Seu ministério terrestre, quando Seus discípulos foram abençoados com Sua presença pessoal. Demoravam-se incansavelmente sobre Seus ensinos e milagres de cura. Com lábios trêmulos e olhos rasos d'água falavam de Sua agonia no jardim, Sua traição, julgamento e execução, a paciência e humildade com que havia suportado a afronta e a tortura a Ele impostas por Seus inimigos e a divina piedade com que tinha orado por Seus algozes. Sua ressurreição e ascensão e Sua obra no Céu como Mediador do homem caído eram tópicos sobre os quais se regozijavam em se demorar. Os pagãos bem podiam chamá-los cristãos, uma vez que pregavam a Cristo e dirigiam suas orações a Deus por intermédio dEle.” AA 157.
Cristo era tudo para eles. Eles falavam e pregavam sobre Ele o tempo todo. Os membros da igreja de Antioquia estavam entusiasmados com a sua nova fé. Essa mesma característica foi identificada nas igrejas modernas que estão crescendo. Segundo o estudo de Schwarz, um traço comum entre elas é que 76% das pessoas que assistem os seus cultos se disseram entusiasmados com elas. Em igrejas que estão em declínio apenas 33% dos seus frequentadores deram a mesma resposta.
Os crentes da igreja que cresce vivem a sua fé com dedicação, paixão, fogo e entusiasmo? Eles têm alegria em falar das ações sociais e espirituais das suas comunidades. Estão realizados por pertencerem àquele grupo religioso e falam do novo estilo de vida que adotaram como a melhor decisão de suas vidas.
Já os membros de igrejas que revelam “tendências legalistas” têm menos paixão espiritual. A pessoa legalista tem o costume de falar mal dos seus irmãos de fé para poderem desviar a atenção de si para os outros. Quando mais denegrida for a imagem dos outros membros melhor ele vai se sentir. Ele sofre da baixa auto-estima espiritual. A sua intolerância é maior para com os jovens. Como muitos deles estão começando na vida cristã, não tem maturidade espiritual suficiente para entender e processar as críticas que recebem daqueles irmãos que parecem tão espirituais. Eles podem começar a perder o seu entusiasmo pela vida cristã. Muitos jovens e adolescentes acabam abandonando a jornada cristã por causa das atitudes farisaicas de irmãos que tem zelo sem entendimento.
Quando falamos sobre saber lidar com os jovens não queremos dizer que devemos “baratear” o evangelho. Baixar os padrões doutrinários da igreja não garante o crescimento da igreja bem como defender a fé verdadeira não garante o seu crescimento.
(Continua)
[1] O resultado deste estudo foi apresentado no livro de Christian A. Schwartz: O desenvolvimento natural da igreja. Campinas, SP: Editora Esperança.