A divindade de Cristo é uma questão bem definida no Novo Testamento. Vamos analisar algumas passagens sobre esse tema:
1. Jo 1.1-3. As Testemunhas de Jeová são conhecidas pela sua beligerância contra doutrina da Trindade e a divindade de Cristo. Para dar base as suas doutrinas eles produziram a sua própria tradução da Bíblia, conhecida como Tradução do Novo Mundo (TNM). Como o texto de Jo 1.1 é uma das mais claras passagens bíblicas sobre a divindade de Cristo eles tiveram que adulterar a sua tradução. Na TNM está: “No princípio era a Palavra, e a Palavra estava com Deus, e a Palavra era [um] deus.” Eles alegam que fizeram isso por que a última vez que a palavra “Deus” aparece nessa passagem ela não está acompanhado do artigo definido. Por isso a forma correta de verter a última oração do versículo é “e a Palavra era [um] deus”.
Contudo, a gramática grega diz que quando o predicativo do sujeito (nesse caso “Deus”) não está acompanhado de artigo: “omite-se o artigo diante do nome predicado do sujeito.”[i] Se a construção proposta por eles fosse correta a Bíblia estaria ensinando o biteísmo, fato negado pelas Escrituras. Através do profeta Isaías, o Senhor afirmou: “Antes de mim nenhum deus se formou, nem haverá algum depois de mim.” (Is 43.10).
Podemos dividir Jo 1.1 em três cláusulas:
a) “No princípio era o Verbo”: Antes da criação e do tempo começar, o Verbo já existia. O imperfeito grego en, “era”, é existencial e transmite a idéia de continuidade.
b) “E o verbo estava com Deus”: O termo Deus refere-se ao Pai. “Com Deus” mostra a idéia de um relacionamento dinâmico numa comunhão perfeita na eternidade passada entre o Pai e o Filho. Nessa passagem, João condena o modalismo, que confunde as pessoas divinas, e o unicismo, que nega a pluralidade dentro da divindade.
c) “E o Verbo era Deus”: As idéias deste versículo são progressivas até chegarem ao ápice nesta frase.
2. Jo 1.14. “O Verbo se fez carne”. O verbo “habitar” (gr. skenoo) significa “morar em uma tenda”, ou seja, uma moradia provisória e contrasta com a condição divina de Cristo que é permanente (Cl 2.9).
3. Jo 5.18. A estrutura do texto grego deixa claro que quem afirmou que Jesus era “igual a Deus” não foram os judeus, mas o apóstolo João.
4. Jo 8.58. Jesus afirmou: “antes de Abraão nascer, EU SOU”, remetendo os seus ouvintes às palavras de Ex 3.14 (compare com Is 43.10-13, que na LXX tem uma construção idêntica). Os judeus tomaram em pedras para o apedrejar. Havia cinco motivos pelos quais alguém merecia a pena de morte por apedrejamento. Eram os seguintes: (1) invocação dos mortos, Lv 20.27; (2) blasfêmia, Lv 24.10-23; (3) falsa profecia que levasse o povo à idolatria, Dt 13.5-10; (4) filhos rebeldes, Dt 21.8-21 e (5) adultério e estupro, Dt 22.21-24 e Lv 20.10. Por qual destes crimes Jesus estava sendo acusado? Note que no capítulo 10, João afirma que “novamente os judeus pegaram pedras para apedrejá-lo”, por que Ele se dizia “Deus” (versículos 31 e 33). Além disso, nas Escrituras existe apenas um Eu Sou (Is 48.12; 44.6; Ap 1.8, 17).
5. Jo 17.5. Compare com Is 42.8 e 48.11. “Quando Jesus orou em Jo 17.5 revelou, também de forma incontestável, que queria ser glorificado com a glória do Pai, e que essa glória do Pai (Jeová) não era novidade para ele, já que afirmou que a possuía, junto (no grego, para) do Pai (‘… a glória que eu tive junto de ti’) , antes que o mundo existisse.”
6. Jo 20.28. Aqui Tomé declara a divindade de Cristo. No original grego está: hó kyriós mou kaì hó theós mou, literalmente: “o Senhor meu e o Deus meu”.
7. 1Jo 5.20. Nessa passagem João afirma: “sabemos também que o Filho de Deus veio e nos deu entendimento, para que conheçamos aquele que é o Verdadeiro. E nós estamos naquele que é o Verdadeiro, em Seu Filho Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna.” Para Sérgio Osório[ii] nessa última sentença o apóstolo está se referindo ao Pai e não ao Filho. Porém, para definir a identidade do “verdadeiro Deus e a vida eterna” precisamos ver, em outras partes dessa epístola, a quem João identifica como sendo a Vida Eterna. Na introdução da sua carta, João chama a Jesus Cristo de Vida Eterna (veja 1Jo 1.2). Se Ele é a vida eterna, Ele deve ser “o verdadeiro Deus” referido no texto que estamos estudando.
8. Fp 2.6-9. Cristo não abriu mão da sua Divindade, mas combinou-a com a humanidade. No texto grego a palavra “forma” é morphê. W.C. Taylor comenta sobre este versículo:
“‘Morphê’ significa forma, implicando caráter e natureza essenciais. Está em contraste com schêma que significa figura, semelhança exterior e efêmera. Morphê salienta a natureza divina e real humanidade de Jesus em Fp 2.6 e 7, e schêma salienta a fase passageira de Sua humanidade.” [iii]
Walter Martin explica ainda:
“É interessante notar que o termo grego uparchon, que em Filipenses 2.6 é traduzido como ‘subsistindo’, significa literalmente ‘permanecendo ou não deixando de ser’. Portanto, nesse contexto, cristo nunca deixou de ser Deus, e permaneceu com sua Substância básica. Era realmente Deus ‘manifesto em carne’.”[iv]
9. Cl 2.9. A palavra “habitar” vem do grego katoikeo, de “viver”, “habitar” e tem a idéia de morada permanente.
10. O livro de Hebreus foi escrito para provar a superioridade do Cristianismo sobre os ritos judaicos. No primeiro e segundo capítulos, o autor lança o alicerce de sua argumentação ao apresentar a superioridade de Cristo sobre os anjos e os homens e o apresenta como Deus: veja Hb 1.8 e 9 e compare com Sl 45.6 e 7. Compare Hb 1.2 com 3.4.
Ao longo da argumentação, o autor cita várias passagens do AT para demonstrar os atributos divinos do Filho: Ele é criador (Hb 1.2, 10), mantenedor do universo (vers. 3), digno de adoração (vers. 6), imutável e eterno (vers. 12).
No vers. 3, o escritor diz sobre Jesus: “O Filho é o resplendor da glória de Deus e a expressão exata do Seu ser, sustentando todas as coisas por sua palavra poderosa.” A “expressão exata” é a tradução do gr. charaktêr, que tem sentido de “duplicata exata” da natureza ou ser (gr. hypostasis) de Deus “querendo dizer que Deus Filho duplica de foram exata o ser ou a natureza de Deus Pai de todos os modos, quais quer que seja os atributos ou o poder que Deus Pai tenha, Deus Filho semelhantemente os tem.”[v]
11. 2Pd 1.1. Nessa passagem Pedro chamou Cristo de “Deus”.
[ii] OSÓRIO, Sérgio. A Divindade ou a Trindade? p. 33.
[iii] TAYLOR, W.C. Introdução ao Novo Testamento grego, p. 393.
[iv] MARTIN, Walter. O Império das Seitas, vol. 1, p.116.
[v] GRUDEM, Wayne. Manual de Teologia Sistemática: uma introdução aos princípios da fé cristã, p. 114.