

Passagens bíblicas difíceis em relação ao castigo e futuro dos ímpios
- Em: Teologia
- Por: Alfons Balbach
Há na Bíblia algumas expressões no tocante à sorte dos injustos, que podem à primeira vista embaraçar o leitor e que são freqüentemente citadas pelos imortalistas em apoio à errônea crença da imortalidade da alma e tormento sem fim dos ímpios. Examinemo-las em seguida:
“Eterno”, “para sempre”.
“Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de Mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos” (Mateus 25:41).
“E irão estes para o tormento eterno..” (Mateus 25:46). “E o fumo do seu tormento sobe para todo o sempre..” (Apocalipse 14:11).
“De dia e de noite serão atormentados para todo o sempre” (Apocalipse 20:10).
As palavras “eterno” e “para sempre” são traduzidas do grego “aion” ou “aionios”. O último é um adjetivo derivado do primeiro. Estes termos não significam necessariamente “sem fim”. Podem denotar um período de tempo limitado; os lexicólogos assim definem “aion”:
Liddell & Scott: “Um espaço ou período de tempo, especialmente o período de uma vida, aevum, um século, uma geração, longo espaço de tempo, eternidade; no plural, eis tous aionas ton aionon, por séculos dos séculos, para sempre e sempre. (Gálatas 1:5). Também significa um espaço de tempo claramente definido e marcado, uma era, um século, o período de uma dispensação: ho aion houtos, esta presente vida, este mundo”.
Greenfield: “Duração finita ou infinita, ilimitada duração, eternidade, um período de duração, passado ou futuro, tempo, século, idade, o mundo, o universo”.
Schrevelius: “Um século, um longo período de tempo, duração indefinida, tempo, maior ou menor”.
Sommer: “Tempo, vida, duração, século”.
Quando em linguagem bíblica, se quer denotar um período de tempo mais longo que “aion”, emprega-se “eis tous aionas ton aionon”. Isto é o “aion” desdobrado ou multiplicado. É como se disséssemos “milhares de milhares” (Daniel 7:10) para desdobrar “mil”. Mas mesmo “eis tous aionas ton aionon” não designa necessariamente “tempo sem fim”. Pode significar um período de tempo bem prolongado, mas finito.
A palavra hebraica correspondente a “aion” é “holam”, a qual, segundo os lexicólogos, também denota um período de tempo curto ou longo, finito ou infinito.
É muito frequente, na Escritura, o emprego de “eterno” e “para sempre” com referência a coisas temporárias. Consideremos, a seguir, alguns exemplos nesse sentido:
“E aos anjos que não guardaram o seu principado, mas deixaram a sua própria habitação, reservou na escuridão, e em prisões eternas até o juízo daquele grande dia” (Judas 6). As “prisões eternas” têm limite: estendem-se “até o juízo daquele grande dia” (Ver 1 Coríntios 6:3).
“Assim como Sodoma e Gomorra, e as cidades circunvizinhas, que, havendo-se corrompido como aqueles, e ido após outra carne, foram postas por exemplo, sofrendo a pena do fogo eterno” (Judas 7). O “fogo eterno” que destruiu Sodoma e Gomorra, não está mais ardendo. Não é fato? Como se vê, “eterno” aqui se refere ao tempo que o fogo levou para reduzir a cinzas aquelas cidades impenitentes — um período limitado.
“ [...] seu senhor lhe furará a orelha com uma sovela; e o servirá para sempre” (Êxodo 21:6). O “para sempre” aqui tem seu limite no dia da morte.
“E os seus ribeiros se transformarão em pez, e o seu pó em enxofre, e a sua terra em pez ardente. Nem de noite nem de dia se apagará; para sempre o seu fumo subirá; de geração em geração será assolada: de século em século ninguém passará por ela” (Isaías 34:9-10). Como se nota pelos versículos anteriores, o profeta aqui fala tanto da destruição da terra de Edom como dos juízos que sobrevirão a este mundo na segunda vinda de Cristo. Em ambos os casos o “para sempre” denota um período limitado, pois os fogos que destruíram a Idumeia se apagaram assim que acabaram sua obra destruidora; e da mesma maneira se apagarão os fogos do juízo no fim do mundo, porquanto esta Terra será a morada eterna dos santos. (Ver Mateus 5:5; 2 Pedro 3:13, etc.). As palavras “de século em século” significam em ambos os casos um longo período, mas não um tempo sem fim.
Jonas, referindo-se à sua permanência no ventre do peixe, diz: “ [...] os ferrolhos da Terra correram-se sobre mim para sempre..” (Jonas 2:6). Mas esse “para sempre” só durou “três dias e três noites” (Jonas 1:17).
Haja vista também que “eterno”, quando usado no sentido de ‘sem fim”, às vezes denota não propriamente a continuidade de um ato mas sim os resultados desse ato. Em Hebreus 5:9, fala-se, por exemplo, de uma “salvação eterna”. E o que é eterno aqui? O ato de salvar ou o resultado da salvação? O resultado, evidentemente. Em Hebreus 6:2, lemos de um “juízo eterno”. Disso entendemos que o que é eterno é o efeito do juízo e não o ato de julgar. O mesmo se compreende em relação à “redenção eterna” de que se fala em Hebreus 9:12. Assim, também, caso o “eterno”, da expressão “fogo eterno”, tivesse o significado de “sem fim”, poderíamos entender que esse fogo será eterno nos seus efeitos, isto é, que os seus resultados serão eternos, pois, em realidade, os ímpios serão aniquilados, ou extintos, e jamais poderão libertar-se desse estado. (Obadias 15, 16).
“E, se a tua mão te escandalizar, corta-a; melhor é para ti entrares na vida aleijado, do que, tendo duas mãos, ires para o inferno, para o fogo que nunca se apaga; onde o seu bicho não morre, e o fogo nunca se apaga” (Marcos 9:43-44).
Esta passagem é freqüentemente citada pelos imortalistas como prova do tormento sem fim dos ímpios.
Os termos que Jesus aqui usou eram bem conhecidos pelos Seus ouvintes, e sabiam perfeitamente o que Ele queria dizer. Entendiam que Ele falava de um aniquilamento ou extinção completa dos ímpios pelos elementos destruidores — o fogo e o bicho. Uma ligeira consideração dos termos usados por Jesus nos leva a esta conclusão.
A palavra “inferno” é aqui traduzida do vocábulo grego “Geena”. O lexicólogo Greenfield assim o define: “Geena, o vale de Hinon, ao sul de Jerusalém, celebrizou-se pelo horrendo culto de Moloque, e foi depois poluído por toda espécie de imoralidade e era o receptáculo de todas as carcaças de animais e dos cadáveres de todos os malfeitores. E para consumir essas imundícias, para evitar a peste que certamente seria o resultado da acumulação de tanta imundícia, mantinha-se fogo constantemente ardendo”. E podemos ainda acrescentar: O que o fogo não consumia era devorado pelos vermes. Estes dois agentes da destruição sempre os havia e, portanto, o aniquilamento dos cadáveres ali lançados era completo. Jesus, pois, apontou para estas cenas bem conhecidas por aqueles a quem falava, para fazer-lhes ver a destruição completa reservada para os ímpios no futuro.
Na passagem em referência, Cristo não fala de almas ou espíritos desincorporados, conscientes e imortais (coisas que não existem) a serem lançados no fogo, mas de pessoas concretas. “ [...] é melhor”, diz Ele, “que se perca um dos teus membros do que seja todo o teu corpo lançado no inferno” (Mateus 5:29). Isto relega a ideia popular de que a “alma desincorporada” do injusto é lançada no inferno por ocasião da morte.
Aquelas palavras de Cristo, referentes ao futuro castigo dos ímpios, baseiam-se evidentemente num trecho das Escrituras bem conhecido dos que O ouviam: “E sairão, e verão os corpos mortos dos homens que prevaricaram contra Mim; porque o seu bicho nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará; e serão um horror para toda carne” (Isaías 66:24). Isto só se verificará depois do milênio, quando deverão ser criados “os céus novos e a Terra nova” (verso 22). Terá então lugar a ressurreição dos ímpios (Apocalipse 20:5-6), chamada “a ressurreição da condenação” (João 5:29). Então é que será executado sobre eles o juízo. Os injustos estão, pois, reservados “para o dia do juízo, para serem castigados” (2 Pedro 2:9). Descerá então o fogo do céu e os devorará (Apocalipse 20:9). Esta será a “segunda morte” (verso 14), a extinção final dos ímpios. Então Deus fará “perecer na Geena tanto a alma como o corpo” (Mateus 10:28) de todo prevaricador. A “alma”, que é a vida, extinguir-se-á primeiro; depois o corpo. Não haverá almas desincorporadas a arder interminavelmente.
“Mas”, perguntará alguém, “como se entende a expressão: ‘o fogo que nunca se apaga’?” Estas palavras são traduzidas do grego “pur asbeston”, que significam “fogo inextinguível” (Ver Marcos 9:43 — Tradução Brasileira). Biblicamente, “fogo inextinguível” não é um fogo que arde sem nunca se apagar, mas um fogo que não se extingue antes de concluir sua obra destruidora. Encontramos na Bíblia vários casos de fogo inapagável, o qual, entretanto, se apagou ao terminar de consumir a matéria ao seu alcance: “E dize ao bosque do sul: Ouve a palavra do Senhor: Assim diz o Senhor Jeová: Eis que acenderei em ti um fogo que em ti consumirá toda a árvore verde e toda a árvore seca; não se apagará a chama flamejante, antes com ela se queimarão todos os rostos, desde o sul até o norte. E verá toda carne que eu, o Senhor, o acendi; não se apagará” (Ezequiel 20:47, 49). “ [...] o Senhor tem sacrifício em Bozra, e grande matança na terra de Edom [...] os seus ribeiros se transformarão em pez, e o seu pó em enxofre, e a sua terra em pez ardente. Nem de noite nem de dia se apagará; para sempre o seu fumo subirá; de geração em geração será assolada; de século em século ninguém passará por ela” (Isaías 34:6-10). Temos um exemplo ainda mais adequado: a destruição de Jerusalém predita pelo Senhor por meio do profeta Jeremias: “Mas, se não Me derdes ouvidos, para santificardes o dia de sábado, e para não trazerdes carga alguma, quando entrardes pelas portas de Jerusalém no dia de sábado, então acenderei fogo nas suas portas, o qual consumirá os palácios de Jerusalém, e não se apagará” (Jeremias 17:27). A Versão dos Setenta (Septuaginta) usa aqui a mesma expressão que em Marcos 9:43 — “pur asbeston”. Esse “fogo inapagável”, entretanto, se apagou depois de destruir a cidade. O cumprimento dessa predição contra Jerusalém é assim descrito noutra parte das Escrituras: “E queimaram a casa do Senhor, e derrubaram os muros de Jerusalém, e todos os seus palácios queimaram a fogo, destruindo também todos os seus preciosos vasos [...] para que se cumprisse a palavra do Senhor, pela boca de Jeremias ..” (2 Crônicas 36:19-21). O “pur asbeston” é de fato um fogo que não se apaga antes de estar tudo reduzido a cinzas.