

Minneapolis, 1888
No ano da Assembléia Geral de Minneapolis, Ellen G. White publica a sua mais importante obra: O Grande conflito. Nesse livro, a autora reafirma a plena divindade de Cristo, ao dizer que “Cristo, o Verbo, o Unigênito de Deus, era um com o eterno Pai - um na natureza, no caráter e no propósito.” GC493. Nesta citação, ela destaca a igualdade existencial que há entre o Pai e o Filho. Por fim, ela estabelece uma íntima relação entre o ensino da divindade de Cristo e a compreensão do plano da salvação:
“Pessoa alguma que alimente este erro [negar a divindade de Cristo] pode ter exato conceito do caráter ou missão de Cristo, nem do grande plano de Deus para a redenção do homem.” GC 524.
E. J. Waggoner (1853-1916) percebe essa relação entre uma boa compreensão da natureza de Cristo e a doutrina da salvação. Não temos a transcrição das palestras feitas por A. T. Jones (1850-1923) e E. J. Waggoner durante a histórica Assembléia Geral de 1888. Mas podemos ter uma idéia dos argumentos que Waggoner usou durante essas reuniões na sua obra Christ Our Righteousness [Cristo e Sua justiça], que foi publicado em 1892. Nesse pequeno livreto, o autor destaca a importância de entendermos Cristo como Deus, pois do contrário Ele não poderia se tornar o nosso Salvador:
“Na verdade, o fato de que Cristo é parte da Divindade, possuindo todos os atributos da divindade, sendo igual ao Pai em todos os aspectos, como Criador e legislador, é a única força que há na expiação. É isto somente que torna a redenção uma possibilidade. Cristo morreu ‘para conduzir-nos a Deus’ (1 Pedro 3.18), mas se lhe faltasse um jota de igualdade com Deus, não poderia conduzir-nos a Ele. A divindade significa ter os atributos da deidade. Se Cristo não fosse divino, então somente poderíamos ter um sacrifício humano. Não importa, mesmo que se conceda que Cristo foi a mais elevada inteligência do Universo; nesse caso Ele seria súdito, devendo aliança à lei, sem habilidade de cumprir mais do que o Seu próprio dever. Ele não poderia dispor de justiça para comunicar a outros. Há distância infinita entre o mais elevado anjo já criado e Deus, portanto, o mais elevado anjo não poderia soerguer o homem caído e torná-lo participante da natureza divina. Os anjos podem ministrar, Deus somente pode remir. Graças damos a Deus por sermos salvos, ‘mediante a redenção que há em Cristo Jesus’, em quem habita toda a plenitude da divindade corporalmente e que é, portanto, capaz de salvar plenamente aqueles que vêm a Deus por Ele.”[i]
Apesar de Waggoner crer que Cristo não era eterno (veja o capítulo 1), ele defendia a igualdade de atributos entre Ele e o Pai. Essa ênfase era a base de seu entendimento sobre a doutrina da salvação. As discussões que ocorreram durante a Assembléia teve um forte impacto no ministério profético de Ellen White. As obras que ela publicou a partir daquele evento foram centradas na pessoa de Jesus Cristo e na Sua salvação. Step to Christ [O caminho a Cristo] foi impresso pela primeira vez em1892; em 1896 publicou-se Thoughts from the Mount of Blessing [o Maior discurso de Cristo]; já a sua mais importante obra sobre a pessoa de Cristo, The Desidere of Ages [O Desejado de todas as nações] saiu do prelo em 1898 e dois anos depois foi a vez do livro Christ’s Object Lessons [Parábolas de Jesus].
Mudança de paradigma
Além de sua nova ênfase sobre o tema da justificação pela fé, depois dessas reuniões Ellen White revela uma compreensão mais clara sobre a natureza divina de Cristo. A publicação do livro O Desejado de Todas as Nações vai ser o grande divisor de águas nesse debate. Nesta obra, Ellen White assume uma posição contrária a que os pioneiros tinham ensinado até ali quanto a Trindade e a eternidade de Cristo. Nas primeiras palavras do livro, ela explica:
“‘Ele será chamado pelo nome de Emanuel (que quer dizer: Deus conosco).’ Mt 1.23. O brilho do ‘conhecimento da glória de Deus’ vê-se ‘na face de Jesus Cristo’. Desde os dias da eternidade o Senhor Jesus Cristo era um com o Pai; era ‘a imagem de Deus’, a imagem de Sua grandeza e majestade, ‘o resplendor de Sua glória’. Foi para manifestar essa glória que Ele veio ao mundo. Veio à Terra entenebrecida pelo pecado, para revelar a luz do amor de Deus, para ser ‘Deus conosco’. Portanto, a Seu respeito foi profetizado: ‘Será o Seu nome Emanuel.’ Is 7.14.” DTN 19.
Mas as palavras mais impactantes seriam escritas no capítulo em que ela comenta a ressurreição de Lázaro:
“Em Cristo há vida original, não emprestada, não derivada. ‘Quem tem o Filho tem a vida’. A divindade de Cisto é a certeza de vida eterna para o crente.” Idem, 507.
Esta afirmação ia contra o que os pioneiros ensinavam sobre a eternidade de Cristo até aquela época. Para Ellen White Jesus não teve origem e nem foi gerado pelo Pai, pois ela afirma que Jesus tem vida original, não derivada. Quando a escritora comenta sobre a ressurreição de Cristo, ela afirma:
“Quando foi ouvida no túmulo de Cristo a voz do poderoso anjo, dizendo: ‘Teu Pai Te chama’, o Salvador saiu do sepulcro pela vida que havia em Si mesmo.” Idem, 753.
Além de destacar a plena divindade de Cristo nesse livro, ao se referir ao Espírito Santo ela o chama de a “terceira pessoa da divindade”:
“Ao pecado só se poderia resistir e vencer por meio da poderosa operação da terceira pessoa da Trindade[1], a qual viria não com energia modificada, mas na plenitude do divino poder.” Idem, 671.
Assim, sua compreensão trinitariana de Deus agora está completa. Suas declarações a partir desse momento caminham para a consolidação dessa posição.
[1] Ellen G. White nunca usa a palavra Trindade (Trinity) para se referir a Deus nos seus escritos. Ela prefere usar sempre a palavra Divindade (Godhead, em inglês). O uso da palavra Trindade na tradução das suas obras em português é um erro de tradução.